14março
Ah! Eu já.
Quem não?
Em algum momento, já acreditamos ser possível arrancar uma tensão nos ombros, arrancar uma lembrança que espeta, arrancar a insatisfação com o trabalho que nos sustenta, arrancar a barriga considerada inadequada, arrancar a sensação de culpa que invade e desarruma.
A gente pode achar que é possível arrancar tudo isso, como quem arranca aquele dente que grita. Uma espécie de “pronto, passou!”.
Com o dente até pode ser assim, viu!? Mas na vida das relações, dos desafetos, das escolhas, do corpo, arrancar é desmembrar-se, interromper processos de amplitude de si, deixar de sentir o que está ali, posto.
É preciso olhar o incômodo, (re)conhecer o incômodo, conversar com o incômodo, para sair do incômodo.
Só não é possível arrancar.
Muitas pessoas buscam o arrancar quando iniciam uma psicoterapia. E buscam o arrancar com a melhor das intenções, porque querem sossego, olhares amorosos, felicidade, ou qualquer outra sensação mais agradável a aquela que comparece naquele momento.
Inclusive, muitas pessoas desistem da psicoterapia quando descobrem que não é possível arrancar.
Eu entendo. Seria mais fácil, mais simples, mais prático, né!? Entretanto, é importante uma recordação: não somos de um tempo programado.
Temos nosso próprio tempo, como diria Renato Russo.
Um tempo sensível e delicado, ora cadenciado, de habitar-se como feto, de experimentar rostos difíceis de olhar no espelho, de replantio.
Recolher, antes. Incluir, antes. Ancorar, antes.
Para cuidar e deixar os seus poros absorverem novos sentidos.
Imagem: @worldviewmag
"Não tenho ensinamentos a transmitir. Tomo aquele que me ouve pela mão e o levo até a janela. Abro-a e aponto para fora. Não tenho ensinamento algum, mas conduzo um diálogo." | Martin Buber