27junho
Hoje, iniciei o dia lendo um artigo muito necessário, chamado “As diásporas da bixa preta: sobre ser negro e gay no Brasil”, de Lucas Veiga. E recomendo muito, por sinal!
Cada leitura na aridez do racismo, tem sido um mergulho que sinto íntimo e silencioso. Sinto dificuldades em escrever sobre isso, inclusive, e estar aqui falando é desafio. Esse mergulho envolve sempre muitas memórias, meus caminhos, meus “olhos d’água”, meu peito aquecido quando acontece encontro ou meu peito vazio quando acontece desencontro, meus processos em uma pele negra, em um cabelo que é crespo, em traços que por muito tempo desejei trocar. É solo desértico, solitário, destrutivo.
São percursos experimentados, compartilhados e que representam alguns dos efeitos do racismo nas subjetividades e nos corpos negros.
O lugar onde nos colocaram historicamente e que não cessou, comunica negação. Por diversos lados e tempos. E isso reverbera drasticamente na maneira pela qual habitamos em nós, no outro, no entre, nos espaços. Porque se na constituição de si, como o humano ou humana que é, não se teve possibilidade (sócio-política-econômica) de colo, de estima, de raiz, me diz: como não se sentir des.colado (a)? Como não se sentir com uma autoestima submersa? Como não se sentir desenraizada(o) da experiência de ser gente?
E nisso há dor. Muitas vezes indizível, outras vezes raiva densa e legítima. Uma dor que é partilhada entre os iguais, uma dor que também se manifesta diferente, considerando recortes em termos de classe social, gênero, fenótipos, por exemplo.
De acordo com Neusa Santos Souza, “ser negro no Brasil é tornar-se negro”. E nessa reconstrução, é primordial buscar seus “espaços de aquilombamento”. Entre aspas, porque não fui eu que pensei, conheci a partir de Lucas Veiga, nesses meus estudos iniciais com o curso Psicologia Preta.
Sintam que precioso. O quilombo é respiro e abrigo. É onde a gente se sente pertencente, onde a vida pode ser preservada, é onde há encontro e conforto de ser. Portanto, pret@, construir seus “espaços de aquilombamento” é ato fundamental para o cuidado de si e do nós.
Assim, as fraturas e os pedaços que ficam pelo caminho podem ser olhados, compreendidos e ressignificados. O retorno ao mundo, assim, pode acontecer de forma mais fortalecida, apesar de.
Isso é sobre permanecer vivo(a), sentindo os ventos da amorosidade, sabendo-se grande. Mais que necessário.
Fotografia: @alifyaharazi
"Não tenho ensinamentos a transmitir. Tomo aquele que me ouve pela mão e o levo até a janela. Abro-a e aponto para fora. Não tenho ensinamento algum, mas conduzo um diálogo." | Martin Buber