21dezembro
Certa vez, escutei que o corpo não é aleatório. Isso fez tanto sentido pra mim. Existe todo um vocabulário corporal que se manifesta através das formas, posturas, tônus, carga de energia e sintomas psicossomáticos. Existem registros históricos no corpo.
James Kepner, autor que tanto cito por aqui, nos apresenta a noção de estrutura corporal biológica e de estrutura corporal adaptativa. A primeira, refere-se ao que compartilhamos enquanto pessoas: garanto que você também tem músculos, ossos e órgãos. A segunda, comunica a biografia e as narrativas de um corpo atravessado pelo imponderável, pelo sensual, pelos encantos e encontros, pelos desencontros também, negligências e desamparos. Um corpo temperado por circunstâncias tantas e distintas, que dão contorno, volume e tamanho, encharcados de passado, de presente ou futuro.
O que conta um corpo?
“A anatomia, na verdade, diz respeito a um processo vivo e dinâmico, um mistério, uma iniciação, a forma da experiência que dá origem ao sentimento, ao pensamento e à ação. Refere-se a nós, como formas de sentir. Refere-se à história genética, embriológica e pessoal. Refere-se às agressões que recebemos em nossas famílias e em sociedade e ao que fizemos para preservar nossa própria integridade sob coação. A anatomia, na verdade, refere-se à forma que nos foi dada pela natureza, às que tivemos que criar como partes de uma sociedade ou família específicas, e à que estamos moldando neste momento”. – Stanley Keleman
E não acabou. O corpo continua encontrando ajustamentos criativos e possíveis, enquanto houver vida correndo nas veias. É um corpo-continuidade, em processo vivo e dinâmico, como disse Keleman, e que pode estar automatizado, fixado em padrões adoecidos, interrompido nos fluxos, nas espontaneidades, nas formas singulares e livres de movimentos e expressões. Assim, tornando-se corpo aprisionado, corpo que não questiona, corpo indisponível ou desvitalizado. Mas ainda há vida, ainda há potência. E precisamos lembrar disso.
"Não tenho ensinamentos a transmitir. Tomo aquele que me ouve pela mão e o levo até a janela. Abro-a e aponto para fora. Não tenho ensinamento algum, mas conduzo um diálogo." | Martin Buber